sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Da solidão para a solitude

Jesus nos chama da solidão para a solitude. O medo de ficarem sozinhas petrifica as pessoas. Uma criança que muda para uma nova vizinhança diz, em soluços, para sua mãe: “Ninguém brinca comigo.”
Uma caloura na faculdade suspira pelos dias de ginásio quando era o centro de atenção: “Agora sou uma figura apagada.” Um executivo abatido no escritório, poderoso, não obstante, sozinho. Uma senhora idosa reside em um asilo aguardando a hora de ir para o “Lar”.
Nosso medo de ficarmos sozinhos nos impulsiona para o barulho e para as multidões. Conservamos uma constante torrente de palavras mesmo que sejam ocas. Compramos rádios que prendemos ao nosso pulso ou ajustamos ao nossos ouvidos de sorte que, se não houver ninguém por perto, pelo menos não estamos condenados ao silêncio.
T. S. Eliot analisou muito bem nossa cultura quando disse: “Onde deve encontrado o mundo em que ressoará a palavra? Aqui não pois não há silêncio suficiente.”
Mas a solidão ou o barulho não são nossas únicas alternativas. Podemos cultivar uma solitude e um silêncio interior que nos livra da solidão e do medo. Solidão é o vazio interior. Solitude é realização interior. Solitude não é, contudo, um lugar, mas um estado da mente e do coração.
Há uma solitude do coração que pode ser mantida em todas as ocasiões. As multidões, ou a sua ausência, têm pouco que ver com este estado atentivo interior. É perfeitamente possível ser um eremita e viver no deserto e nunca experimentar a solitude. Mas se possuirmos solitude interior nunca teremos medo de ficar sozinhos, pois sabemos que não estamos sós.
Nem tememos estar com outros, pois eles não nos controlam. Em meio ao ruído e confusão encontramos calma num profundo silêncio interior.
A solitude interior há de manifestar-se exteriormente. Haverá a liberdade de estar sozinhos, não para nos afastarmos das pessoas, mas para poder ouvi-las melhor. Jesus viveu em “solitude do coração” interior.
Também freqüentemente experimentou solitude exterior. Ele começou seu ministério passando quarenta dias sozinho no deserto (Mateus 4:1-11).
Antes de escolher os doze, ele passou a noite inteira sozinho no monte deserto (Lucas 6:12). Quando recebeu a notícia da morte de João Batista, Jesus “retiro-se dali num barco, para um lugar deserto, à parte” (Mateus 14:13).
Após a alimentação miraculosa dos cinco mil, Jesus mandou que os discípulos partissem; então ele despediu as multidões e “subiu ao monte a fim de orar sozinho...”(Mateus 14:23). Após uma longa noite de trabalho, “Tendo-se levantado alta madrugada, saiu, foi para um lugar deserto, e ali orava”(Marcos 1:35).
Quando os doze retornaram de uma missão de pregação e curas, Jesus os instruiu: “Vinde repousar um pouco, à parte...” (Marcos 6:31). Depois da cura de um leproso, Jesus “se retirava para lugares solitários, e orava” (Lucas 5:16). Com três discípulos ele buscou o silêncio de monte solitário como palco para a transfiguração (Mateus 17:1-9).

Enquanto se preparava para sua mais sublime e mais santa obra, Jesus buscou a solitude do jardim do Getsêmani (Mateus 26:36-46). Pode-se prosseguir, mas talvez isto seja suficiente para mostrar que a busca de um lugar solitário era uma prática regular de Jesus. Igualmente deve ser conosco.
Em Life Together (Vida Juntos), Dietrich Bonhoeffer deu a um de seus capítulos o título de “O Dia Juntos”, e com percepção intitulou a capítulo seguinte “O Dia Sozinho”. Ambos são fundamentais para o êxito espiritual. Escreveu ele:
Aquele que não pode estar sozinho, tome cuidado com a comunidade... Aquele que não está em comunidade, cuidado com o estar sozinho...Cada uma dessas situações tem, de si mesma, profundas ciladas e perigos.
Quem desejar a comunhão sem solitude mergulha no vazio de palavras e sentimentos, e quem busca a solitude sem comunhão perece no abismo da vaidade, da auto-enfatuação e do desespero.
Portanto, se desejarmos estar com os outros de modo significativo, devemos buscar o silêncio recriador da solitude. Se desejamos estar sozinhos em segurança, devemos buscar a companhia e a responsabilidade dos outros. Se desejamos viver em obediência, devemos cultivar a ambos.
Solitude e silêncio
Sem silêncio não há solitude. Muito embora o silêncio às vezes envolva a ausência de linguagem, ele sempre envolve o ato de ouvir. O simples refrear-se de conversar, sem um coração atento a voz de Deus, não é silêncio.
Devemos entender a ligação que há entre a solitude interior e silêncio interior. Os dois são inseparáveis. Todos os mestres da vida interior falam dos dois de um só fôlego.
Por exemplo, a Imitação de Cristo, que tem sido obra prima incontestável da literatura devocional durante cinco séculos, tem uma seção intitulada “Do amor da solidão e do silêncio”.
Dietrich Bonhoeffer faz os dois um todo inseparável em Vida Juntos, como o faz Thomas Merton em Thoughts in Solitude (Pensamentos em Solitude). Com efeito, lutamos por algum tempo tentando resolver se daríamos a este capítulo o título de Disciplina da solitude ou Disciplina do silêncio, tão estritamente ligados são os dois em toda a importante literatura devocional.
Devemos, pois, necessariamente entender e experimentar o poder transformador do silêncio se desejarmos conhecer a solitude.
Diz um antigo provérbio: “O homem que abre a boca, fecha os olhos!” A afinidade do silêncio e da solitude é poder ouvir. O controle, e não a ausência de ruído, é a chave do silêncio. Tiago compreendeu claramente que a pessoa capaz de controlar a língua é perfeita (Tiago 3:1-12).
Sob a Disciplina do silêncio e da solitude aprendemos quando falar e quando refrear-nos de falar. A pessoa que considera as Disciplinas como leis, sempre transformará o silêncio em algo absurdo: “Não falarei durante os próximos quarenta dias!” Esta é sempre uma grave tentação para o verdadeiro discípulo que deseja viver em silêncio e solitude.
Thomas de Kempis escreveu: “É mais fácil estar totalmente em silêncio do que falar com moderação”. O sábio pregador de Eclesiastes disse que há “tempo de estar calado, e tempo de falar”(Eclesiastes 3:7). O controle é a chave.
As analogias que Tiago faz do leme e dos freios, sugerem que a língua tanto guia como controla. Ela guia nosso curso de muitas formas. Se contamos uma mentira, somos levados a contar mais mentiras para encobrir a primeira. Logo somos forçados a comportar-nos de modo a darmos crédito à mentira. Não admira que Tiago tenha dito: “a língua é fogo” (Tiago 3:6).
A pessoa disciplinada é a que pode fazer o que precisa ser feito quando precisas ser feito. O que caracteriza uma equipe de basquetebol num campeonato é ser ela capaz de marcar pontos quando necessários.
Muitos de nós podemos encestar a bola, mas não o fazemos quando necessário. Do mesmo modo, uma pessoa que está sob o Disciplina do silêncio é a que pode dizer o que necessita ser dito.
“Como maçãs de ouro em salvas de prata, assim é a palavra dita a seu tempo”(Provérbios 25:11). Se ficamos calados quando deveríamos falar, não estamos vivendo na Disciplina do silêncio. Se falamos quando deveríamos estar calados, novamente erramos o alvo.
O Sacrifício de Tolos
Lemos em Eclesiastes : “ Chegar-se para ouvir é melhor do que oferecer sacrifícios de tolos” (Eclesiastes 5:1). O sacrifício de tolos é conversa religiosa de iniciativa humana.
O pregador continua: “Não te precipites com tua boca, nem o teu coração se apresse a pronunciar palavra alguma diante de Deus; porque Deus está nos céus, e tu na terra; portanto sejam poucas as tuas palavras”(Eclesiastes 5:2).
Quando Jesus tomou a Pedro, Tiago e João e os levou ao monte e foi transfigurado diante deles, Moisés e Elias apareceram e entabularam a conversa com Jesus. O texto grego prossegue: “E respondendo, Pedro disse-lhes... se queres farei aqui três tendas...”(Mateus 7:14). Isto é tão expressivo. Não havia alguém falando com Pedro. Ele estava oferecendo sacrifícios de tolos.
O Diário de John Woolman contém um comovente e terno relato da aprendizagem do controle da língua. Suas palavras tão expressivas que é melhor citá-las aqui:
Eu ia a reunião num terrível estado mental, e me esforçava por estar interiormente familiarizado com a linguagem do verdadeiro Pastor. Um dia, encontrando-me sob forte operação do espírito, levantei-me e disse algumas palavras numa reunião; mas não me mantendo junto à abertura Divina falei mas do que era exigido de mim.
Percebendo logo meu erro, fiquei com a mente aflita algumas semanas, sem nenhuma luz ou consolo, ao ponto mesmo de não encontrar satisfação em nada. Lembrava-me de Deus, e ficava perturbado, e no auge de minha tristeza ele teve piedade de mim e enviou o Consolador.
Então senti o pecado de minha ofensa; minha mente ficou calma e tranqüila, e senti-me verdadeiramente grato ao meu gracioso Redentor por suas misericórdias.
Cerca de seis meses após este incidente, sentindo aberta a fonte de amor Divino, e interesse por falar, proferi umas poucas palavras em uma reunião, nas quais encontrei paz.
Sendo assim humilhado e disciplinado sob a cruz, minha compreensão tornou-se mais fortalecida para distinguir o espírito puro que interiormente se move sobre o coração, que me ensinou a esperar em silêncio, `às vezes durante muitas semanas, até que senti aquele fluxo quer prepara a criatura para [posicionar-se como uma trombeta, através da qual o Senhor fala ao seu rebanho.
Que descrição do processo de aprendizado pelo qual se passa na Disciplina do silêncio! De particular significado foi o aumento de sua capacidade, proveniente desta experiência, de “distinguir o espírito puro que interiormente se move sobre o coração”.
Um motivo de quase não agüentarmos permanecer em silêncio é que ele nos faz sentir tão desamparados. Estamos demais acostumados a depender das palavras para manobrar e controlar os outros. Se estivermos em silêncio, quem assumirá o controle? Deus fará isto; mas nunca deixaremos que ele assuma o controle enquanto não confiarmos nele.
O silêncio está intimamente relacionado com a confiança. A língua é nossa mais poderosa arma de manipulação. Uma frenética torrente de palavras flui de nós porque estamos num constante processo de ajustar nossa imagem pública.
Tememos muito o que pensamos que as outras pessoas vêem em nós, de modo que falamos a fim de corrigir o entendimento delas. Se fiz alguma coisa errada e descubro que você sabe disso, serei muito tentado a ajudá-lo a entender minha situação!
O silêncio é uma das mais profundas Disciplinas do Espírito simplesmente porque ela põe um paradeiro nisso. Um dos frutos do silêncio é a liberdade de deixar que nossa justificação fique inteiramente com Deus.
Não temos necessidade de corrigir os outros. Há uma história de um monge medieval que estava sendo injustamente acusado de certos erros.
Certo dia ele olhava pela janela e viu lá fora um cachorro a morder e rasgar um tapete que havia sido pendurado para secar. Enquanto ele observava, o Senhor falou-lhe, dizendo: “É isso que estou fazendo com sua reputação.
Mas se você confiar em mim, não terá necessidade de preocupar-se com as opiniões dos outros”. Talvez, mais do que qualquer outra coisa, o silêncio leva-nos a crer que Deus pode justificar e endireitar tudo.
George Fox falava com freqüência do “espírito de escravidão”(Romanos 8:14), e de como o mundo jaz nesse espírito.
Freqüentemente ele identificava o espírito de escravidão com o espírito de subserviência a outros seres humanos. Em seu Diário ele falava de “ajudar as pessoas a escapar dos homens”, afastá-las do espírito de escravidão à lei mediante outros seres humanos. O silêncio é o principal meio de conduzir-nos a esse livramento.
A língua é um termômetro; ela diz qual é a nossa temperatura espiritual. Ela é, também, um termostato; controla nossa temperatura espiritual. O controle da nossa língua pode significar tudo.
Temos nós sido libertados de modo que podemos controlar nossa língua? Bonhoeffer escreveu: “O silêncio verdadeiro, a verdadeira tranqüilidade, o controle real da língua manifesta-se somente como a sóbria conseqüência da calma espiritual”.
Relata-se que Dominic fez uma visita a Francisco de Assis e durante todo o encontro nenhum deles proferiu uma única palavra. Somente quando tivermos aprendido a estar verdadeiramente calados ‘é que estaremos capacitados para proferir a palavra necessária no momento oportuno.
Catherine de Haeck Doherty escreveu: “Tudo em mim é silente... e estou imersa no silêncio de Deus”. É na solitude que chegamos a experimentar o “silêncio de Deus” e assim receber o silêncio interior que é o anseio de nosso coração.
A Noite Escura da Alma
Levar a sério a Disciplina da solitude significará que em algum ponto ou pontos no curso da peregrinação entraremos no que S. João da Cruz vividamente descreveu como “a noite escura da alma”.
A “noite escura” para a qual ele nos chama não é algo mau ou destrutivo. Pelo contrário, é uma experiência a ser recebida com agrado do mesmo modo que uma pessoa enferma receberia com agrado uma cirurgia que promete saúde e bem-estar. A finalidade da escuridão não é castigar-nos ou afligir-nos. É libertar-nos.
Que significa entrar na noite escura da alma? Pode ser um senso de aridez, de depressão, até mesmo o de sentir-se perdido. Ela nos despoja de dependência excessiva à vida emocional..
A noção, tantas vezes ouvida hoje, de que tais experiências podem ser evitadas e que devíamos viver em paz e conforto, alegria e celebração, só revela o fato de que muito da experiência contemporânea não passa de sentimentalismo superficial.
A noite escura é um dos meios de Deus levar-nos à tranqüilidade, à calma, de modo que ele possa operar a transformação interior da alma.
Como se expressa essa noite na vida diária? Quando se busca seriamente a solitude, geralmente há um fluxo de êxito inicial e então um desânimo inevitável e com ele um desejo de abandonar por completo a busca. Os sentimentos vão-se embora e fica o senso de que não alcançamos Deus. S. João da Cruz descreveu-o deste modo:
...a escuridão da alma mencionada aqui... põe os apetites sensórios e espirituais a dormir, amortece-os e os priva da capacidade de encontrar prazer em qualquer coisa. Ata a imaginação e impede-a de fazer qualquer bom trabalho discursivo.
Ela faz cessar a memória, faz o intelecto tornar-se obscuro e incapaz de entender qualquer coisa, e daí levar a vontade também a tornar-se árida e constrita, e todas as faculdades vazias e inúteis. E acima de tudo isto, paira uma densa e cansativa nuvem que aflige a alma e a conserva afastada de Deus.
Em seu poema “Canciones del Alma”, S. João da Cruz usou duas vezes a frase: “Estando minha casa agora totalmente calada”. Nessa expressiva linha ele indicava a importância de silenciar todos os sentidos físicos, emocionais, psicológicos, e mesmo espirituais.
Toda distração do corpo, mente e espírito deve ser posta numa espécie de animação suspensa antes que possa ocorrer esta profunda obra de Deus na alma. O anestésico deve fazer efeito antes que se realize a cirurgia.
Virá o silêncio, a paz, a tranqüilidade interiores. Durante esse tempo de escuridão, a leitura da Bíblia os sermões, o debate intelectual_ tudo falhará em comover ou emocionar.
Quando o amoroso Deus nos atrai para uma escura noite da alma, muitas vezes somos tentados a culpar todo o mundo e todas as coisas por nosso entorpecimento interior e procuramos livrar-nos dela.
O pregador é maçante. O cântico de hinos é tão fraco. Talvez comecemos a andar por aí à procura de uma igreja ou de uma experiência que nos dê “arrepios espirituais”. Esse é um grave engano.
Reconheça a noite escura pelo que ela é. Seja agradecido porque Deus o está amorosamente desviando de toda distração, de modo que você possa vê-lo. Em vez de ridicularizar e brigar, acalme-se e espere.
Não estou aqui a falar de entorpecimento espiritual que vem como resultado de pecado ou desobediência. Falo da pessoa que busca a Deus com afã e não abriga pecado conhecido em seu coração.
Quem há entre vós que tema ao Senhor, e ouça a voz do seu Servo que andou em trevas sem nenhuma luz, e ainda confiou em nome do Senhor e se firmou sobre o seu Deus? (Isaías 50:10)
O ponto da passagem bíblica é que é perfeitamente possível temer, obedecer, confiar e firmar-se no Senhor e ainda “andar em trevas sem nenhuma luz”. A pessoa vive em obediência mas entrou numa noite escura da alma. S. João da Cruz disse que durante esta experiência há uma graciosa proteção contra vícios e um maravilhoso progresso nas coisas do reino de Deus.
Se uma pessoa na hora dessas trevas observar bem de perto, verá com clareza quão pouco os apetites e as faculdades se distraem e como ela está segura de evitar vanglória, orgulho e presunção, alegria vazia e falsa, e muitos outros males.
Pelo andar em escuridão a alma não somente evita extraviar-se mas avança rapidamente, porque assim ela adquire virtudes.
Que deveríamos fazer durante essa época de aflição interior? Primeiro, não leve em consideração o conselho dos amigos bem-intencionados de livrar-se da situação. Eles não entendem o que está acontecendo. Nossa época é tão ignorante destas coisas que não lhe recomendo conversar sobre esses assuntos.
Acima de tudo, não tente explicar nem justificar por que você parece estar “aborrecido”. Deus é seu justificador; entregue seu caso a ele. Se você pode, realmente, retirar-se para um “lugar deserto” durante algum tempo, faça-o. Se não, cumpra suas tarefas diárias.
Mas, esteja no “deserto” ou em casa, mantenha no coração um profundo, interior e atencioso silêncio - e haja silêncio até que a obra da solitude se complete.
Talvez S. João da Cruz tenha estado a conduzir-nos a águas mais profundas do que cuidássemos ir. Por certo ele não está falando de um reino que muitos de nós vemos apenas “como em espelho, obscuramente”.
Não obstante, não temos necessidade de censurar-nos por nossa timidez de escalar esses picos nevados da alma. Esses assuntos são mais bem tratados com cautela.
Mas talvez ele tenha provocado dentro de nós uma atração por experiências mais elevadas, mais profundas, não importa quão leve o puxão. É como abrir levemente a porta de nossa vida a este reino. Isto é tudo o que Deus pede, e tudo o que ele necessita.
Para concluir nossa viagem na noite escura da alma, ponderemos estas palavras poderosas de nosso mentor espiritual:
Oh, então, alma espiritual. Quando vires teus apetites obscurecidos, tuas inclinações secas e constritas, tuas faculdades incapacitadas para qualquer exercício interior, não te aflijas; pensa nisto como uma graça, visto que Deus te está libertando de ti mesma e tirando de ti tua própria atividade.
Conquanto tuas ações possam ter alcançado bom êxito, não trabalhaste tão completa, perfeita, e seguramente – devendo à impureza e inabilidade de tais ações – como fazes agora que Deus te toma pela mão e te guia na escuridão, como se fosses cega, ao longo de um caminho e para um lugar que não conheces. Nunca terias tido êxito em alcançar este lugar, não importa quão bom sejam teus olhos e teus pés.
Passos Para a Solitude
As Disciplinas Espirituais são coisas que fazemos. Nunca devemos perder de vista esse fato. Podemos falar piedosamente acerca da “solitude do coração”, mas se isto, de certo modo, não abrir caminho para nossa experiência, então erramos o alvo das Disciplinas.
Estamos lidando com ações, e não apenas com estados mentais. Não é suficiente dizer: “Bem, muito certamente estou na posse da solitude e silêncios interiores; não há nada que eu necessite fazer”.
Todos quantos chegaram aos silêncios vivos fizeram determinadas coisas, ordenaram suas vidas de uma forma especial, de modo que recebessem a “paz de Deus, que excede todo o entendimento”. Se desejamos ter êxito, devemos ir além do teorético para as situações da vida.
Quais são alguns passos para a solitude? A primeira coisa que podemos fazer é tirar vantagem das “pequenas solitudes” que enchem nosso dia.
Consideremos a solitude daqueles primeiros momentos matutinos na cama, antes que a família desperte. Pense na solitude de uma xícara de café pela manhã, antes de começar o trabalho do dia.
Existe a solitude de pára-choque de um carro junto ao pára-choque de outro durante a correria do tráfego na hora de mais movimento.
Pode haver poucos momentos de descanso e refrigério quando dobramos um esquina e vemos uma flor ou uma árvore. Em vez da oração audível antes de uma refeição, considere convidar a todos para reunir-se em uns poucos momentos de silêncio.
De quando em quando, dirigindo um carro lotado de crianças e adultos conversadores, eu exclamava: “Vamos brincar de fazer silêncio e ver se ficamos absolutamente calados até chegarmos ao aeroporto” (cerca de cinco minutos adiante). Funcionava.
Saia um pouquinho antes de ir deitar-se, e prove a noite silenciosa.
Muitas vezes perdemos esses pequeninos lapsos de tempo. Que pena! Eles podem e deveriam ser redimidos. São momentos para silêncio interior, para reorientar nossas vidas como o ponteiro de uma bússola. São pequenos momentos que nos ajudam a estar genuinamente presentes onde estamos. Que mais podemos fazer? Podemos encontrar ou criar um “lugar tranqüilo” para silêncio e solitude.
Constantemente estão sendo construídas novas casas. Porque não insistir que um pequeno santuário interior seja incluído nas plantas, um pequeno lugar onde um membro da família possa estar a sós em silêncio? Que é que nos impede? Construímos esmeradas salas de estar, e achamos que vale a pena a despesa. Se você já possuiu uma casa, considere murar uma pequena seção da garagem ou do pátio.
Se mora num apartamento, seja criativo e ache outros meios de permitir-se a solitude. Sei de uma família que tem uma cadeira especial; sempre que uma pessoa se assenta nela, é como estar dizendo: “Por favor, não me amole; quero estar a sós”.
Encontre lugares fora de sua casa: um local num parque, o santuário de uma igreja (dessas que mantêm abertas sua portas), mesmo um depósito em algum lugar. Um centro de retiro perto de nós construiu uma bonita cabana para uma pessoa, especificamente para meditação particular e solitude. Chama-se “Lugar Tranqüilo”.
As igrejas investem somas enormes de dinheiro em edifícios. Que tal construir um lugar aonde alguém possa ir para estar a sós durante alguns dias? Catherine de Haeck Doherty foi pioneira no desenvolvimento de Poustinias (palavra russa que significa “deserto”) na América do Norte.
São lugares destinados especificamente para solitude e silêncio.
No capítulo sobre estudo, consideramos a importância de observar a nós mesmos para ver com que freqüência nossa conversa é uma tentativa frenética de explicar e justificar nossas ações.
Tendo observado isto em você mesmo, experimente praticar ações sem nenhuma palavra de explicação. Note seu senso de temor de que as pessoas entendam mal por que você fez o que fez. Tente deixar que Deus seja seu justificador.
Discipline-se de modo que a suas palavras sejam poucas mas digam muito. Torne-se conhecido como uma pessoa que, quando fala, sempre tem algo a dizer. Mantenha clara sua linguagem. Faça o que diz que fará. “Melhor é que não votes do que votes e não cumpras” (Eclesiastes 5:5).
Quando a língua se encontra sob a nossa autoridade, as palavras de Bonhoeffer se tornam verdadeiras em relação a nós: “Muita coisa desnecessária fica por dizer. Mas a coisa essencial e útil pode ser dita em poucas palavras”.
Dê outro passo. Tente viver um dia inteiro sem proferir palavra alguma. Faça-o, não como uma lei, mas como um experimento. Note seus sentimentos de desamparo e excessiva dependência das palavras para comunicar-se. Procure encontrar novos meios de relacionar-se com outros, que não dependam de palavras. Aproveite, saboreie o dia.Aprenda com ele.
Quatro vezes por ano retire-se durante três a quatro hora com a finalidade de reorientar os alvos de sua vida. Isto pode ser facilmente feito em uma noite. Fique até tarde no escritório, faça-o em casa, ou procure um canto sossegado em uma biblioteca pública. Reavalie suas metas e objetivos.

Que é que você deseja ser ver realizado daqui a um ano? Daqui a dez anos? Nossa tendência é superestimar em alto grau o que podemos realizar em dez. Estabeleça metas realistas, mas esteja disposto a sonhar, a esforçar-se. No sossego dessas breves horas, ouça o trovão da voz de Deus. Mantenha um registro diário do que lhe acontece.
A reorientação e fixação de metas não precisam ser frias e calculadas, como alguns imaginam, feitas com uma mentalidade de análise de mercado. Pode ser que ao entrar num silêncio atento, você receba a deliciosa impressão de que este ano deseja aprender a tecer ou trabalhar com cerâmica.
Essa lhe parece uma meta muito terrestre, anti-espiritual? Deus está intencionalmente interessado em tais questões. Está você? Talvez deseje aprender (experimentar) mais acerca dos dons espirituais de milagres, de cura e de línguas. Ou você pode fazer como um amigo que sei que está gastando longos períodos de tempo experimentando o dom de socorros, aprendendo a ser servo.
Talvez no próximo ano você gostaria de ler todas as obras de C. S. Lewis ou de D. Elton Trueblood. A escolha desses alvos soa-lhe como jogo de manipulação de um vereador? Claro que não. Não se trata de meramente estabelecer uma direção para a sua vida. Você está indo para algum lugar, por isso é muito melhor ter uma direção fixada pela comunhão com o Centro divino.
Na Disciplina do estudo examinamos a idéia de retiros de estudos de dois ou três dias. Tais experiências, quando combinadas com uma imersão interior no silêncio de Deus, são enaltecidas. À semelhança de Jesus, devemos afastar-nos das pessoas de modo que possamos estar verdadeiramente presentes quando estivermos com elas. Faça um retiro uma vez por ano, sem outro propósito em mente que não a solitude.
O fruto da solitude é o aumento de sensibilidade e compaixão por outros. Surge uma nova liberdade para estar com as pessoas. Há uma nova atenção para com suas necessidades, nova responsividade para com suas mágoas. Thomas Merton observou.
É na profunda solitude que encontro a afabilidade a qual posso verdadeiramente amar a meus irmãos. Quanto mais solitário estou, tanto mais afeição eu sinto por eles. É pura afeição e cheia de reverência pela solitude dos outros. Solitude e silêncio ensinam-me a amar a meus irmãos pelo que eles são, e não pelo que dizem.
Não sente você um toque, um anseio de aprofundar-se no silêncio e solitude de Deus? Não deseja uma exposição mais profunda, mais completa à Presença de Deus? A Disciplina da solitude é que abrirá a porta. Você está convidado a vir e “ouvir a voz De Deus em seu silêncio todo-abrangente, maravilhoso, terrível, suave e amoroso”.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Descontinuidade

“Peçam, e lhes será dado; busquem, e encontrarão; batam, e a porta lhes será aberta. Pois todo o que pede, recebe; o que busca, encontrará; e àquele que bate, a porta será aberta”.
(Mateus 7:7-8 – NVI)

As conquistas honestas enaltecem e coroam os esforços de quem as buscou com firme confiança e determinismo. No entanto, em meio do caminho, por circunstâncias outras, as cálidas vitórias escaparam uma a uma. O saldo aponta estrago sem conta envolto por um imenso e doloroso vazio.
Essa realidade, não rara, alcança a vida de muitos. Parece-nos que o modelo da oração colocada acima se aplica especificamente para uma alma ávida em refazer o terreno perdido. De igual modo, num segundo estágio – o da reconquista – a mesma oração deixa transparecer que a luta será desafiadora, difícil. O Senhor, ao ensiná-la, a fez olhando para os seus amados quando envolvidos em precárias condições. “E encontrareis descanso para as vossas almas”. Jesus prometeu!
Resta saber qual a direção a tomar para a volta confiável. Sem dúvida o melhor caminho é o percorrê-lo todo, mas em sentido contrário. Com muita propriedade o profeta aconselhou: “Coloque marcos e ponha sinais nas estradas. Preste atenção no caminho que você trilhou. Volte, ó Virgem Israel! Volte para as suas cidades” (Jeremias 31:21 – NVI). Nesse novo caminhar – o que quem volta – alguns marcos foram cravadas na ida assinalando as derrotas sofridas e as suas causas. Em meio ao infortúnio, atabalhoado, fica a imaginar qual a direção segura a seguir para a volta sem percalços. Um pouco antes da difícil escolha, a indicação salvadora. “Quem busca encontra ‘Jesus’”.
O Filho Pródigo, longe de casa, sem esperança, desacreditado de si próprio, ilustra a oração da busca das pedras. O rapaz percorreu o mesmo caminho e reencontrou o lar, um dos bens perdidos. Apesar de calorosamente recebido pelo pai, precisava refazer o estrago deixado. As almas sinceramente arrependidas, ardendo em fé se refazem primeiramente a si mesmas. O grande “novelo encastoado”, envolto em pecados sem conta, pela graça, recomeça a desatar dando à reconquista da continuidade o retorno vitorioso. “A quem bate, abrir-se-lhe-á”, Palavra de Jesus!

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Deus acolhe ao pecador arrependido

No filme ‘Mission’ (Missão), Mendoza, quem era o comerciante espanhol de escravos, consegue fazer grandes riquezas com o produto de sua atividade. Mas sofre extremamente pelo remorso da sua consciência e entra numa crise moral e espiritual. O padre Gabriel, líder de uma organização missionária, diz-lhe para que procure às pessoas que ele maltratou e vendeu como escravos e que os ajude por meio de seu serviço. Mendoza une-se a esta organização missionária. Sobe escarpado e atravessa bosques para encontrar-se com os nativos. Leva consigo os poucos pertences que tinha.
Carregava com muito esforço sobre as suas costas, o pesado armamento e a espada que antes usava. Uma vez no povo, os nativos saem ao seu encontro dando-lhe as boas-vindas. Mas, ao ver a Mendoza, que antes os caçava para vendê-los, mostraram-se aterrorizados. Uma pessoa toma uma faca e se aproxima dele. Mendoza se ajoelha. O peso da bolsa que contém a causa do seu remorso causa uma dor muito aguda sobre os seus ombros. Levanta o rosto expressando que está pronto para receber o castigo merecido. O homem do povo levanta a faca e a deixa cair. Mas, em vez de cortar a cabeça de Mendoza, corta a bolsa que ele levava. A bolsa cai e rola sobre o solo. A cena muda-se com as atitudes de Mendoza. Havia-se ajoelhado como um homem com feridas, mas agora se levanta restaurado. Ele, que antes se encontrava destruído, agora se levanta íntegro e santificado.
Isto é o que Deus faz conosco. A santidade de Deus pode causar feridas e sofrimentos, mas quando nos submetemos a Deus, Ele corta as cargas que levamos, queima o pecado e nos traz a liberdade.
Sem dúvida alguma, o pecado pode nos afastar de Deus, mas, Ele sempre está pronto para derramar a Sua graça e a Sua misericórdia para com os Seus filhos amados. É apenas uma questão de se humilhar diante dEle e reconhecer os meus erros e Ele será misericordioso e Se alegrará em nos acolher.
Pr. Paulo Kim

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Como ter uma discussão saudável

              Antes de começar a falar sobre a discussão, gostaria em primeiro lugar, tentar definir o sentido da palavra discussão, e para isso, estarei usando as palavras do Dr. Gary Chapman:
“Antes, permita-me esclarecer o que quero dizer quando uso a palavra ‘discussão’. Trata-se de um termo bastante conhecido na área do Direito. Os advogados e promotores apresentam e discutem seus argumentos para mostrar que a pessoa que defendem ou acusam é culpada ou inocente. Esses argumentos são declarações que os advogados e promotores fazem com base nas evidências disponíveis. A função deles é a de apelar ao senso lógico e à razão do júri. A conclusão é óbvia: qualquer pessoa racional há de concordar com meus argumentos. De vez em quando, um advogado ou promotor também pode apelar para as emoções do júri, mostrando aspectos do caso como objetivo de cooptar a simpatia dos jurados e convencê-los de seus argumentos.
Num tribunal, a discussão dos argumentos é absolutamente permitida. Na verdade, nenhum processo pode ser levado a juízo sem que os dois lados apresentem seus argumentos. O advogado e o promotor apresentam evidências e suas respectivas interpretações na tentativa de convencer o júri de que a posição que cada um defende é a que está com a razão. É possível cruzar os depoimentos das testemunhas, e as conclusões também podem ser questionadas. O sistema jurídico é baseado na suposição de que, por meio da discussão dos argumentos e contraargumentos apresentados, o júri terá mais recursos para descobrir a verdade da culpa ou da inocência do réu.
Todos nós sabemos que a causa da justiça nem sempre é servida de maneira apropriada num tribunal, mas, na pior das hipóteses, é dada alguma solução ao caso que está sendo julgado [...] Em todos estes casos, alguém ganha e alguém perde. Quando isso acontece, uma das partes provavelmente ouvirá seu advogado fazer um comentário mais ou menos assim: “Pensei que nossos argumentos fossem bons, pelo jeito, o júri não se convenceu de nossas razões”. Já o advogado da  outra parte, a vencedora, deve dizer algo como: “Ganhamos o caso. Os argumentos eram consistentes, e acho que o júri reconheceu com quem estava a verdade”.
Quando você opta por discutir com seu cônjuge, na verdade está fazendo uma escolha: a de usar um sistema jurídico para convencê-lo da verdade e da propriedade de sua opinião. Infelizmente, o que funciona relativamente bem num tribunal não serve muito para o relacionamento conjugal, pois não há juiz disponível para determinar qual das duas partes está com a razão e qual não está. As discussões logo ficam carregadas de emoção, e é possível que você acabe falando em tom agressivo, gritando ou chorando; dizendo coisas que destruirão o caráter da pessoa com quem convive; colocando em dúvida os motivos que ele ou ela apresenta; e condenando o comportamento do cônjuge, classificando-o como grosseiro indelicado ou descontrolado
Quando você briga com o cônjuge, o objetivo que tem em mente é o mesmo que teria se estivesse num tribunal: tudo o que deseja é ganhar a causa. Você quer que o seu lado da questão receba o benefício da justiça, e que seu cônjuge seja considerado culpado das suas acusações. É isso que há de tão prejudicial nas brigas e discussões”[1].
                A forma de discutir saudavelmente não descobri por acaso, e muito menos sou eu o autor desta descoberta. Também sou uma das pessoas que tive um problema sério de relacionamento. Pensava dentro de mim, a razão destas discussões tão fortes, sendo que as minhas intenções foram boas. Foi quando à procura desta razão, eu encontrei as bibliografias do Dr. John Gottman, onde ele fez uma pesquisa bastante profunda sobre os relacionamentos conjugais. Ele é o  professor de psicologia da Universidade de Washington, e também terapeuta dos casais.
                Uma das coisas que me chama a atenção, é que depois de ter lido as suas bibliografias, e ter aplicado no meu dia a dia, houve uma mudança radical. Também tenho orientado a vários casais, e todos eles também experimentaram as mudanças dentro de suas casa. Em outras palavras, quero dizer que todas as pessoas podem experimentar esta mudança dentro de suas casa. Os livros que ele tem escrito são livros com fundamentos científicos, onde ele dedicou grande parte da sua vida em experimentos com diferentes tipos de casais.
                A causa do Dr. Gottman ter feito estas pesquisas foi porque ele também sofreu o divórcio quando tinha 31 anos de idade. Quando ele apenas começava a sua vida de docência, a sua esposa fez as malas e saiu dizendo que já não podia mais conviver com ele. Por mais que ele pensasse, não conseguia entender a razão dela tê-lo deixado, sendo ele uma pessoa inteligente e de bom coração. O que mais o preocupava, é por ter sido divorciado com 31 anos, o seu coração começou a temer a quantidade de divórcios que ele teria de enfrentar nos próximos 40 a 50 anos de vida. Por isso, ele começou a pesquisar cientificamente para impedir os futuros possíveis divórcios. Desde o anos 1971 ele começou a fazer a pesquisa cientificamente, visitando o convívio dos casais pessoalmente. Dr. Gottman não buscou as teorias nem as filosofias de vida, e sim a praticidade da vida das pessoas, pois, como ele desconhecia das formas de enfrentar as diferentes situações, ele quis aprender de perto vendo o convívio das pessoas. Gottman quis saber as causas pelo qual os casais conseguiam ter um relacionamento saudável, e as causas dos casais se divorciarem. Visitou aproximadamente a 3.000 casais todos os finais de semana gravando o convívio de cada casal, para saber que tipo de conversa eles tinham, o que eles faziam, como discutiam, e como enfrentavam as diferentes situações. Também observou os fatos fisiológicos, como por exemplo: quando estão alterados, o quanto sobe a sobrancelha, o quanto sobe o tom de voz, qual é a frequência do batimento cardíaco, como também, anotou as profissões, as personalidades, a situação financeira de cada casal, etc.
                Até antes dele começar a pesquisa, ele pensava também que a causa do divórcio fosse pelas diferenças de personalidade, dos vícios, das agressões, ou por causa dos sogros e/ou parentes. Mas, depois da pesquisa, chegou à conclusão de que todas estas causas são nulas para o divórcio. Então, concluiu dizendo que por não ter diagnosticado direito, nós não soubemos remediar de forma adequada. Não é pelo fato da pessoa ser introvertida ou extrovertida que o casal tem um convívio melhor, e muito menos pelo fato dos dois terem uma mesma personalidade, ou uma personalidade totalmente oposta. A causa do divórcio era pela forma de discussão do casal. Em outras palavras, o divórcio não acontece pelo conteúdo da discussão, e sim pela forma.
                Com base a esta pesquisa, vemos que existem quatro formas nocivas de discussão. As quatro formas nocivas de discussão, não vem das atitudes, e sim das formas de se expressar. São elas:
a) Crítica.
Uma forma de atacar a pessoa enfatizando nas suas fraquezas;
b) Defesa.
Todas as pessoas que são atacadas, elas buscam uma forma de se defender, e neste caso, seria a forma de se defender apontando também a fraqueza do “adversário”. As pessoas podem perguntar se o ato de se defender é tão nocivo para levar um casamento a um divórcio. A resposta é afirmativa, pois quando as pessoas começam a discutir atacando e se defendendo, as discussões começam a se tornar pesadas, e quando perceber que a situação está ficando desfavorável para si, então começa a ir para o passado apontando as atitudes similares tomadas naquela época, trazendo as outras pessoas (amigos, familiares, conhecidos, companheiros de trabalho, etc.) para dentro da discussão. Quando isso começar a se tornar uma rotina, então um dos dois lados se cansa, e decide então, se separar.
c) Comparação.
É a forma mais nociva dentro de uma discussão. É quando a pessoa começa a comparar a outra pessoa consigo mesmo, tirando a autoestima da outra pessoa. Também pode ser desvalorizando a pessoa, ou até mesmo colocando apelido na pessoa. Estas atitudes mostram que a pessoa se compara com a outra fazendo-se superior a ela tanto na ética, como também na inteligência, ou até mesmo nos seus talentos. O fato de inferiorizar a pessoa é tão nociva que, segundo os estudos, dentro de quatro anos, a pessoa que é comparada (inferiorizada), sofre de enfermidades infecciosas agudas, onde uma das enfermidades mais comuns são as enfermidades renais.
d) Criar muro.
Depois de várias tentativas, quando perceber que já não existe um acordo, então o casal começa a criar muros, ignorando a presença da outra pessoa, ou seja, fazendo de conta que a outra pessoa não existe.
                Estas são as quatro formas de levar um casamento para o divórcio. Mas, se analisarmos bem, podemos dizer que tirando estas quatro formas de  discussão, não existem outros motivos para se discutir.
                Podemos comparar estas quatro formas nocivas de discussão com o veneno. Já que nós encontramos o veneno, agora é a hora de buscar o antídoto para poder curar a relação envenenada.
                Encontramos dois tipos de casais. Aqueles que discutem e logo em seguida se reconciliam, e a proximidade do casal se faz mais forte e resistente, onde o relacionamento melhora, se enche de esperança. E aqueles que a discussão leva o casal para um relacionamento patológico.
                Tem-se perguntado por quê o primeiro grupo consegue superar todas estas barreiras mesmo discutindo como todos. A resposta é que o primeiro grupo usa o antídoto adequadamente em seu relacionamento. Os antídotos são:
a) Em vez de criticar, pedir em primeira pessoa.
Um exemplo comum, é quando um dos cônjuges (que neste caso citarei aos maridos), chega tarde para casa e não janta o jantar que a esposa preparou.
A forma crítica de se expressar seria: “Você poderia ter ligado já que chegaria atrasado”. “Você sempre se esquece”.
Quando a conversa começa com você, geralmente é uma forma de criticar o próximo.
O antídoto neste caso seria: “Ontem eu pensei que você fosse cedo, e preparei um strogonoff que você tanto gosta. Mas como você se atrasou, a comida se esfriou e fique um pouco chateada.”.
Desta forma poderia tornar uma conversar mais amena, e quando a outra pessoa ouvir a sua queixa, sem dúvida também refletirá e pedirá desculpas pelo atraso.
Este exemplo, é um exemplo comum que coloquei para ilustrar a crítica e o seu antídoto. Mas, o fato é que muitos casais sofrem por causa destes dois pontos nocivos (crítica e defesa). Se as pessoas soubessem que a crítica fosse tão nociva, não teriam usado em seus passados, mas, pela falta de informação muitos casais usaram esta ferramenta nociva, e hoje sofrem de um relacionamento patológico.
Segundo a pesquisa do Dr. Gottman, diz que as mulheres são as que mais criticam, e os homens são os que mais criam os muros no relacionamento. Mas, isto não é uma via de regra, pois posso dizer que eu sendo um homem, também já tenho criticado muito as pessoas, assim como também existem homens que criticam mais do que as mulheres.
                Gostaria de citar o exemplo de um casal amigo que fiz nos Estados Unidos. David é um coreano que se imigrou para os Estados Unidos desde criança, e a sua esposa Jane, foi para os Estados Unidos já jovem, para terminar o seu mestrado na faculdade. Apesar da Jane ter morado vários anos nos Estados Unidos, ela não conhecia a vida social dos americanos pela razão dela ter-se dedicado os anos de estudo dentro da faculdade. A rotina dela era sala de aula, biblioteca, comedor, biblioteca e dormitório. Em contraste com a Jane, David cresceu nos Estados Unidos, tem bastantes amigos americanos e a sua convivência é mais “americanizada” do que coreana. Depois dois se casarem, David, por ser professor da faculdade de engenharia civil, convidou os seus colegas de trabalho. Jane, por não conhecer a cultura americana, ao saber do convite fez um banquete no estilo coreano, e no dia seguinte ficou de cama, pois teve que preparar a comida e lavar as louças sozinha. Quando David viu esta cena, ficou bravo com a Jane e começou a criticar dizendo: “Você não deveria ter preparado tudo aquilo. Viu só no que deu? Você que tem o mestrado, e ensina para os jovens, não tem a sabedoria para fazer as coisas?”. Estas palavras foram bastante duras para Jane. Ela somente quis fazer o que sempre viu a sua mãe fazer em casa, evitando que a reputação do seu esposo caísse. Ao escutar as críticas do seu marido, logo começou a criar muros no seu relacionamento. O que ela não entendia, era que na sociedade americana, quando se faz um convite, eles preparam apenas alguns sanduíches e o vinho. Por outro lado, David não conseguia compreender a forma da Jane expressar o amor.
                Nós podemos ver que o David começa com a crítica das ações da Jane, e Jane, por outro lado, faz a sua defesa. As suas discussões sempre foram de crítica e defesa, até que um dia vieram me procurar pedindo por uma ajuda. Talvez, se David tivesse sido um pouco mais amoroso e agradecesse pelo esforço da Jane de ter preparado o “banquete”, isso pudesse ter animado mais a sua esposa. A expressão que David usou foi: “Você é sempre exagerada nas coisas. Até quando você continuará sendo exagerada?”. Podemos notar duas palavras que resultaram em desencadeamento de uma discussão: “Você” e “Sempre”. O fato de ter-se dirigido a segunda pessoa “você”, e enfatizar o tempo “sempre”. “Sempre”, “todas as vezes”, “maior parte do tempo”, são expressões que muitas vezes são usadas para uma crítica. A segunda frase do David, “até quando você continuará sendo exagerada?”, podemos interpretar a uma comparação. Jane se sentia comparada em relação ao tempo e duvidava inclusive das suas ações. Expressões que levou Jane a perder sua autoestima diante do David.
                Por outro lado, Jane não conseguia compreender as atitudes de David, levando a pensar que David estava equivocado em suas ações. Quando recebeu as críticas do seu esposo de não ter senso da realidade, ela se defendia negando a afirmação de David. E aqui nós podemos ver um segundo antídoto para enfrentar a situação.
b)      Reconhecimento
No caso da Jane, se ela reconhecesse só um pouco que ela havia exagerado no preparo da comida, David por outro lado poderia esclarecer a sua preocupação por ela. Em outras palavras, se Jane em vez de se defender, tivesse reconhecido um pouco do seu exagero, David também estaria reconhecendo que ele também havia sido duro com ela. Nós precisamos começar com a premissa de que todos nós somos falhos, e nós também temos o direito de errar. No caso da Jane, não era um erro a sua atitude, e sim, um forma de demonstrar o seu amor e a sua preocupação por David. Mas, no momento em que os dois reconhecem o exagero, tanto no preparo como na expressão, a conversa seguinte fluirá de forma mais suave, onde cada um estaria explicando a razão das suas atitudes.
Se nós formos analisar, podemos dizer que na sociedade existem apenas três tipos de conversa:
1. Conversa que se aproxima;
A conversa que se aproxima é aquela conversa onde ambos mostram interesse no tema da conversa. Por exemplo, quando o esposo comenta que no final de semana a globo transmitirá o jogo de futebol, a esposa poderia estar demonstrando o interesse perguntando quais são os times que estarão jogando.
Segundo as pesquisas, em uma conversa que se aproxima, além de fazer com que o coração de ambos se aproxime, fisiologicamente faz com que o nível de estresse abaixe em alta porcentagem.
2. Conversa que se afasta;
Uma conversa que se afasta a pessoa, é quando um dos lados diz algo, e o outro responde com uma resposta totalmente incoerente. Por exemplo, o marido pode comentar que nesta noite o seu time estará jogando e será transmitida no canal aberto, e a esposa incoerentemente olhar para a janela e responder dizendo: “olhe para a janela, as flores estão lindas”. Ou seja, apesar dos dois “conversarem”, por não existir uma coerência em suas conversas, o coração de ambos começa a se distanciar.
3. Conversa que cria inimizade.
Quando uma pessoa expõe a sua idéia e o outro encara, critica ou zomba desta idéia, é uma conversa que cria inimizade. Por exemplo, no caso do David e Jane, se o David criticasse a Jane “por que você fez tanta comida assim?”, e a Jane respondesse “o que você quer que eu faça? Você convida as pessoas e quer que fique de braços cruzados?”. Esta forma de encarar o parceiro é forma de chamá-lo para uma possível inimizade. Segundo as pesquisas feitas pelo Dr. Gottman, diz que nestes casos, o coração de ambos fica acelerado, e o nível de estresse sobe significativamente.
Um outro exemplo que posso citar é de um casal que atendi recentemente onde a esposa veio me procurar bastante triste. Na semana anterior, o casal havia viajado para o interior e ela se maravilhou presenciando a beleza da lua cheia. Maravilhada com aquela imagem, chamou o seu marido para contemplar juntos, mas o seu marido fez uma crítica bastante severa dizendo: “Olhe só para a sua idade. Nós já vimos esta lua cheia diversas vezes na vida. Você já passou da idade de se viver no mundo da fantasia”.
No caso da conversa que se aproxima, motiva a continuidade da conversa, pois o diálogo é saudável e faz com que ambos se sintam bem. Dr. Gottman diz que a conversa que se aproxima é um depósito da emoção.
                Quando nós falamos de depósito, logo pensamos na nossa conta bancária, onde depositamos parte do nosso salário e desta conta é descontado os gastos dos cartões de crédito ou dos pagamentos automáticos que inserimos nestas contas. Da mesma forma, as emoções do casal também têm uma integração, que dependendo do quanto prestam os favores, dão a atenção, demonstram o afeto, ou zelam um pelo outro, a tudo isto o Dr. Gottman diz que é o depósito das emoções conjugais. É neste caso, quando há uma conversa de aproximação, o depósito das emoções conjugais vai-se acumulando, e quando se tem uma conversa de afastamento, ou que crie uma inimizade, é debitada da conta das emoções conjugais. Alguns sintomas que aparecem quando é debitada da conta das emoções conjugais, é que um dos cônjuges, ou ambos se irrita facilmente, cria-se uma hostilidade, se entristece, se deprime, tem o desejo de se ausentar de casa, ou entra em desespero. Todos estes são sintomas de que tenha se debitado da conta das emoções conjugais. Em oposição a estes sintomas, quando for acumulando a conta das emoções conjugais, aparecem alguns sinais como: sorrir bastante, a expressão facial é tranquila, demonstra otimismo, é esperançoso,  consegue perdoar facilmente, tem o desejo de fazer melhor ao próximo, está sempre agradecido, é feliz, e transmite o otimismo ao próximo.
                Um dos pontos importantes que se destaca, é que para poder acumular a conta das emoções conjugais não é preciso ter um bom coeficiente de inteligência, ou seja, não é preciso ser inteligente, muito menos tem um requisito dos estudos acadêmicos, ou da posição social e/ou financeiro. Qualquer pessoa que deseje e se comprometa em acumular a conta das emoções conjugais, com um pouco de esforço, ao prestar um pequeno favor, ou dar um pouco de atenção e zelo, faz com que aos poucos vá se acumulando esta conta. Do contrário, quando nos irritamos sem motivo, ou comparamos o nosso parceiro com as situações e/ou pessoas, diz-se que a conta das emoções conjugais é debitada bruscamente. Quando nós soubermos destas “armadilhas” e tomarmos o cuidado, com o tempo a conta irá se acumulando, e no futuro, quando houver alguma equivocação de uma das partes, a pessoa ofendida conseguirá perdoá-lo facilmente.


[1] Chapman, Gary (2008), Zero a Zero, pág. 14-16, Editora Mundo Cristão, São Paulo, S. P., Brasil.